segunda-feira, 2 de março de 2009

O trabalho de um(a) enfermeiro(a)!


Recebi um e-mail de uma colega e achei que devia partilhá-lo com quem, por vezes, desconhece a realidade...

Olá a todos! Sei que isto parece mais uma mensagem corrente mas não…

Enviaram-me este e-mail e eu gostava de partilhá-lo com vocês para que saibam que não estamos sozinhos nos nossos sentimentos de impotência!

E para que saibam, que por mais que nós queiramos, não fazemos milagres… Infelizmente…

A D. Maria tem 47 anos e um cancro do ovário. O marido, já reformado, quis satisfazer-lhe o desejo de não morrer no hospital. Têm uma filha, a acabar o curso na universidade: boa aluna, em altura de exames... precisa de estudar e a sua mãe está a terminar os seus dias de vida no quarto ao lado.

A D. Maria está em cuidados paliativos... e sabe disso!

Já não quer comer, bebe apenas alguns goles de água. Tem um soro para que lhe possamos dar a medicação. Tem uma perfusão permanente de morfina, cuja eficácia não é total.

A barriga... como descrever? Tem uma colostomia, que mal funciona, está inchada, como um balão que vai rebentar... E de facto, começa a rebentar: abrem-se fístulas espontaneamente e as fezes saem por todo o lado.

O cheiro? Não consigo descrever!

Há metástases no fígado, no pulmão. A respiração é ofegante... já lá vão 5 semanas...

Diariamente desloco-me a casa da D. Maria, duas ou três vezes: para administrar a medicação, para cuidar daquela barriga, para falar com ela, para dar o apoio possível ao marido que tenta fazer o que sabe e o que pode.

O sofrimento? É grande... de todos!

Mas eu sou enfermeira:

Não é suposto que me seja difícil ver o sofrimento dos outros!

Tudo se torna mais difícil quando estou a sós com a D. Maria, que me agarra na mão e me pede insistentemente... que termine com a vida dela! Os apelos são cada vez mais frequentes, mais desesperados:
“Por favor! Se tem compaixão de mim, injecte-me qualquer coisa para terminar de vez com esta agonia! Pela sua felicidade, por favor, acabe com a minha vida...”
E eu tenho compaixão... mas nada posso fazer! A dor não se consegue controlar, é impossível cuidar dela sem lhe provocar ainda mais dores?

O que faz uma enfermeira?

Vai-se embora, para casa, a sentir-se inútil, a sentir-se incapaz... A ouvir repetidamente aquele apelo e a desejar, embora lhe custe muito, que a eutanásia fosse possível!

Mas, se fosse possível... e a praticasse, como iria para casa?

Mas para quê falar disto?

Os enfermeiros não têm sentimentos!

Saio dali, continuo o meu trabalho domiciliário: agora entro numa barraca, onde chove dentro, onde há ratos, pulgas, lixo... onde o cheiro nos faz perder o apetite!

O Sr. José tem 87 anos e vive sozinho. Tem uma úlcera varicosa. Tenho que fazer o penso. Não há água... nem sequer as mãos posso lavar. Passo-as por álcool à saída e lavo-as na casa do próximo utente.

Mas para quê falar disto?

A minha profissão não é penosa...

Próxima paragem: D. Joaquina, 92 anos, vive numas águas furtadas, 5º andar, sem elevador. Subo as escadas de madeira, apodrecidas, obscuras, com medo que alguma tábua se parta. Carrego com as malas do material...

A D. Joaquina vive com uma irmã, naquele espaço exíguo. Teve uma trombose. Tem úlceras de pressão. O tecto é baixo, inclinado, a cama está encostada à parede. Para lhe prestar cuidados tenho que me pôr de joelhos no chão e ficar inclinada.

Quando me tento endireitar as minhas costas doem... tenho as pernas dormentes... pego nas malas, desço as escadas... continua a chover... procuro o carro que tive que estacionar a 500 metros!

Mas, para quê falar disso?

Os enfermeiros não se queixam...

Próximo desafio: a Helena! Toxicodependente, tem SIDA, continua a consumir.
Com sorte, ainda lá encontro o traficante em casa...

Mas as enfermeiras não têm medo!

Continuo: o Sr. Manuel é diabético, divorciado, tem 50 anos, foi amputado de uma perna, vive sozinho num 3º andar. Há 2 anos que não sai de casa. Das poucas pessoas, com quem convive, são as enfermeiras! Precisa de conversar... como lhe dizer que ainda tenho mais 4, ou 8 pessoas e que não tenho tempo para estar ali a ouvi-lo?

Mas para quê falar disso?

Os enfermeiros só dão injecções e fazem pensos... tudo o resto é supérfluo!

Para quê falar:
da solidão do outro;
da minha impotência;
do pedido de eutanásia;
da chuva;
do frio;
do sol;
do calor;
do mau cheiro;
das minhas dores nas pernas;
das dores nas costas;
do medo;
da insegurança;
do ventre desfeito;
da tristeza..

Não, a penosidade e o risco devem ser uma ilusão minha...

Não, as enfermeiras não choram!

Mas sabem? As lágrimas que mais doem são aquelas que não correm!

Não tenham dúvidas: os milhares de enfermeiros e enfermeiras são os heróis do dia a dia!
E tantas vezes, mas tantas vezes, não são reconhecidos e até subestimados…

Não peço que passes a não sei quantas pessoas ou em determinados minutos do dia, apenas peço que tenhas mais consideração por esta profissão daqui para a frente!